quarta-feira

Ao contrário do mais comum, o JL. Borges fala o que evitar e não o que fazer na escrevinhação

Existe uma ideia antiga segundo a qual o escritor nasce..., é isso, já nasceria com o dom e a coisa só fluiria naturalmente.

Se era assim no passado, pelo visto as coisas mudaram, pois ao que tudo indica o escrevinhador tem tudo a ver com um trabalho duro no aperfeiçoamento e traquejo do tal ofício.

O que bem tem por aí são dicas mil para facilitar o uso e familiaridade não só com as ideias/inspiração, assim como no uso mais apropriado do vernáculo para cair nas boas graças dos eventuais leitores. O que temos que admitir cada vez mais raros, logo, o traquejo no trato é uma boa ideia.

Fora disso o escrevinhamento não vai passar de uma atividade bem pessoal, como um diário íntimo, ou seja, só procê.

Veja essas ideias do J.L.Borges sobre uns lances que não devem ser feitos, pois assim a coisa pode ficar mais fácil, aspas [ou não...].

Confira abaixo.

Na literatura é preciso evitar:

1. As interpretações demasiado inconformistas de obras ou de personagens famosos. Por exemplo, descrever a misoginia de Don Juan, etc.

2. As comparações de personagens grosseiramente diferentes ou contraditórios, como, por exemplo, Don Quixote e Sancho Pança, Sherlock Holmes e Watson.

3. O costume de caracterizar os personagens por suas manias, como faz, por exemplo, Dickens.

 4. No desenvolvimento da trama, o recurso a jogos extravagantes com o tempo ou com o espaço, como fazem Faulkiner, Borges e Bioy Casares.

5. Em poesias, situações ou personagens com os quais possam o leitor se identificar.

6. Os personagens suscetíveis de converter-se em mitos.

7. As frases, as cenas intencionalmente ligadas a determinado lugar ou a determinada época; ou seja, ao ambiente local.

8. A enumeração caótica.

9. As metáforas em geral, e em particular as metáforas visuais. Mais concretamente ainda, as metáforas agrícolas, navais ou bancárias. Exemplo absolutamente desaconselháveis: Proust.

10. O antropomorfismo.

11. A construção de novelas cuja trama ou argumento remete a outro livro. Por exemplo, em Ulisses de Joyce e a Odisseia de Homero. 

12. Escrever livros que pareçam menus, álbuns, itinerários ou concertos.

13. Todo aquele que pode ser ilustrado. Todo o que pode sugerir a ideia de ser convertido em filme.

14. Nos ensaios críticos, toda referência histórica ou biográfica. Evitar sempre as alusões a personalidades ou à vida privada dos autores estudados. Sobretudo, evitar a psicoanálise. 

15. As cenas domésticas nas novelas policialescas; as cenas dramáticas nos diálogos filosóficos. E, finalmente. 

16. Evitar a vaidade, a modéstia, a pederastia, a ausência da pederastia, o suicídio.

         Jorge Francisco Isidoro Luís Borges Azevedo (1899 — 1986) escritor, poeta, tradutor, crítico literário e ensaísta argentino. 

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